terça-feira, 25 de março de 2025

ACIDENTES DE TRABALHO COM MATERIAL BIOLÓGICO

 

UNIDADE 3 – AULA 4

Medidas de Prevenção e Controle de

 Infecção

Classificação de artigos de acordo com a carga

 microbiana

A classificação dos artigos proposta por Earle Spaulding (1968) e amplamente adotada em recomendações como a Resolução nº 15 do Ministério da Saúde divide esses materiais em artigos críticos, semicríticos e não críticos, levando em consideração seu potencial de transmissão de microrganismos. Eles são assim classificados:

·    Objetos críticos: são aqueles que têm contato direto com a corrente sanguínea ou outras áreas estéreis do corpo, como instrumentos cirúrgicos, cateteres, agulhas e implantes. Esses materiais devem obrigatoriamente passar pelo processo de esterilização;

·    Objetos semicríticos: são aqueles que têm contato com mucosas íntegras, sem perfuração na pele, como endoscópios e tubos endotraqueais. Esses materiais devem ser esterilizados ou passar por uma desinfecção rigorosa;

·    Objetos não críticos: são aqueles que não entram em contato com o paciente ou têm apenas contato com a pele íntegra, como garrotes para coleta de sangue e mobília. Materiais não críticos podem ser higienizados e desinfetados usando soluções germicidas intermediárias ou apenas água e sabão.

Controle de Infecção

Para falar de controle de infecção, vários conceitos são importantes, tais como:

Antissepsia é o processo de eliminação dos microrganismos presentes na microbiota residente e transitória dos tecidos vivos. Um método comum de antissepsia é a higienização das mãos, que deve ser realizada em cinco momentos: antes do contato com o cliente, antes de procedimentos invasivos ou ao colocar luvas, após exposição a fluidos corporais ou ao retirar luvas, após o contato com o cliente e após tocar áreas próximas ao cliente. A escolha do antisséptico deve ser baseada em sua eficácia germicida e sua capacidade de não irritar a pele ou mucosas. Álcoois, clorexidina e iodos são escolhas frequentes, sendo o álcool e a clorexidina os mais usados.

Nesse contexto, os antissépticos são formulados para serem hipoalergênicos e apresentarem baixa agressividade. Essas soluções são capazes de destruir ou inibir o crescimento de microrganismos presentes na pele e mucosas, desempenhando um papel essencial na manutenção da assepsia e na prevenção de infecções.

A assepsia é o conjunto de medidas adotadas para prevenir a entrada de microrganismos em ambientes que, por sua natureza, deveriam ser livres desses agentes, caracterizando um ambiente asséptico, ou seja, isento ou com baixo risco de infecções. Exemplo: higienização das mãos somado ao uso de equipamentos de proteção individual como o uso de luvas, avental, gorro, máscara, propés, abrir corretamente os materiais para que não sejam contaminados, entre outros. Este conjunto de medidas é muito utilizado em procedimentos invasivos.

Já a desinfecção envolve a eliminação e destruição de microrganismos que não se apresentam na forma esporulada em superfícies e objetos inanimados. Pode ser realizada por agentes físicos e químicos, conhecidos como desinfetantes ou germicidas. Fatores como limpeza prévia do material, tempo de exposição ao desinfetante, concentração do agente, temperatura e pH são cruciais para o sucesso do processo.

Álcoois etílico e isopropílico, hipoclorito de sódio e peróxido de hidrogênio são desinfetantes comuns.

O processo de desinfecção é responsável pela eliminação dos microrganismos patogênicos e/ou inativação de suas toxinas, podendo também inibir o seu desenvolvimento. Entretanto, os esporos não são necessariamente eliminados neste processo (TOMEDI; ALBANESI, 2018). Ele é dividido em três categorias de eficácia: alta, intermediária e baixa.

·         Desinfecção de alto nível: capaz de eliminar todos os microrganismos, exceto alguns esporos bacterianos;

·         Desinfecção de nível intermediário: o bacilo da tuberculose e as bactérias em sua forma vegetativa são inativados, assim como a maioria dos vírus e fungos, excluindo os esporos bacterianos;

·         Desinfecção de baixo nível: consegue eliminar a maioria das bactérias, alguns vírus e fungos, com exceção de microrganismos resistentes, esporos e micobactérias como o bacilo da tuberculose (HINRICHSEN; FERREIRA, 2013).

A esterilização é o procedimento no qual todas as formas de vida microbiana, incluindo bactérias nas formas vegetativas e esporuladas, são destruídas ou eliminadas. No Brasil, métodos físicos e físico-químicos gasosos são os únicos permitidos para esterilizar Produtos para a Saúde (PPS) críticos. A esterilização química manual por imersão (conforme BRASIL, 2009) e pelo calor seco (conforme BRASIL, 2012) foi proibida devido ao risco elevado de falhas humanas, como uso inadequado do agente esterilizante e falta de controle e monitoramento adequados, respectivamente (SECRETARIA DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL, 2020).

Métodos físicos de esterilização

Os métodos físicos de esterilização envolvem o uso do calor em diversas temperaturas e certos tipos de radiação. Para esse propósito, as autoclaves são amplamente recomendadas em ambientes hospitalares.

1. Vapor saturado sob pressão: principalmente empregado em hospitais para esterilizar materiais termorresistentes, esse método coagula as proteínas dos microrganismos, resultando em sua destruição. Embora seja eficaz para materiais resistentes ao calor, não é adequado para itens sensíveis a altas temperaturas.

2. Calor seco: utilizado em estufas, esse processo gera calor irradiando pelas laterais, oxidando as células microbianas e levando à sua morte. No entanto, não é adequado para materiais como borracha, aço ou tecido devido à exposição prolongada a altas temperaturas. É aplicado em laboratórios, não em ambientes hospitalares.

3. Radiação ionizante: esse método danifica o DNA dos microrganismos ou impede sua reprodução. A radiação gama é a mais utilizada devido à sua capacidade de penetrar eficientemente no material a ser esterilizado. Recomendado para materiais termossensíveis e tecidos biológicos, comumente usados em transplantes, embora sua desvantagem seja seu caráter altamente oxidante. Uso restrito.

A autoclave é um instrumento que utiliza vapor saturado, equivalente à temperatura de ebulição da água sob pressão. Ela é o método preferencial devido a sua boa capacidade de difusão nos materiais. A esterilização pelo calor seco foi proibida pela RDC nº 15/2012.

Todos os produtos de saúde que tenham entrado em contato com fluidos corporais, sangue e tecidos devem ser armazenados em recipientes resistentes a rasgos e hermeticamente fechados durante o transporte, a fim de evitar a contaminação do ambiente e dos profissionais.

Além disso, é essencial que todos os produtos de saúde a serem desinfetados ou esterilizados passem por uma limpeza adequada para remover todo material orgânico ou outros resíduos. A limpeza é fundamental para a eficácia dos processos de esterilização e desinfecção, pois sujidades podem impedir que o agente desinfetante ou esterilizante entre em contato com o artigo, dificultando o processo. Assim, produtos de saúde que não podem ser adequadamente limpos não devem ser processados no Centro de Materiais e Esterilização (CME).

Além disso, para garantir o sucesso do processo de esterilização por calor úmido, é crucial que o vapor de água entre em contato com todas as superfícies dos objetos. Quando o vapor entra em contato com as superfícies frias dos objetos, ele se condensa, liberando calor latente. Na autoclave, é aconselhável evitar o contato direto entre embalagens de papel e tecido para evitar a retenção de umidade. Portanto, quando esses materiais são processados juntos, devem ser dispostos em prateleiras separadas da autoclave, sempre na posição vertical e sem sobreposição, para permitir uma exaustão eficaz e uma circulação adequada do ar (Figura 1). Além disso, as embalagens não devem tocar as paredes internas da câmara e a carga não deve ultrapassar 70% da capacidade interna da autoclave.


Esse calor umedece e aquece os materiais, enquanto a desnaturação das proteínas ocorre ao entrar em contato com os microrganismos, levando à sua destruição.

Desnaturação é a perda da forma tridimensional de uma proteína. Neste processo, as proteínas são expostas às condições diferentes àquelas em que foram produzidas. Técnicas de engenharia genética e biologia molecular utilizam deste processo para fazer o sequenciamento de enormes sequências proteicas.

KAMEI, M. C. Biologia e Bioquímica Humana. Maringá: Unicesumar, 2018.

Outra técnica empregada é a esterilização pelo calor seco, realizada por um dispositivo chamado forno de Pasteur (Figura 2), popularmente conhecido como estufa. Nesse método, a esterilização ocorre devido ao aquecimento e à irradiação do calor. No entanto, em comparação com o vapor saturado, o calor seco tem menor capacidade de penetração, o que requer exposição a temperaturas mais altas (entre 120 e 180ºC) por um período prolongado. Entretanto, de acordo com a RDC nº 15/2012 da Anvisa, o método de esterilização de produtos para saúde por calor seco, realizado por meio de estufas, está proibido (SOBECC, 2017).

Métodos físico-químicos de esterilização


Na categoria de métodos físico-químicos de esterilização, destacam-se o uso de óxido de etileno e plasma de peróxido de hidrogênio. O primeiro é regulamentado pela Anvisa e amplamente empregado em ambientes hospitalares devido a sua não corrosividade. O Óxido de Etileno é um gás penetrante, ideal para materiais termossensíveis, o qual pode ser utilizado enquanto os produtos ainda estão em suas embalagens originais, sendo implementado por empresas especializadas.

Já o peróxido de hidrogênio é indicado para itens termossensíveis e tem um processo de esterilização que dura aproximadamente uma hora. Pode ser aplicado em polímeros, alguns metais, vidros e borrachas, sendo menos complexo que o óxido de etileno, resultando em processos mais rápidos e não tóxicos. Contudo, devido à sua natureza corrosiva, requer cuidados no manuseio e tem câmaras de esterilização de tamanho reduzido, limitando sua aplicação. É desaconselhado para esterilizar alguns produtos com materiais específicos.

Qualidade no processo de esterilização

Assegurar a qualidade do processo de esterilização depende da execução adequada de cada etapa no reprocessamento dos materiais. A presença de microrganismos nos artigos está diretamente ligada a falhas humanas na limpeza e preparo do material, bem como a falhas mecânicas decorrentes da falta de manutenção e defeitos na autoclave.

No caso do reprocessamento por autoclave, utilizam-se processos químicos e biológicos, enquanto na estufa, são usados apenas indicadores químicos. Destacamos o uso de fitas termossensíveis (Figura 3), que reagem quimicamente durante a esterilização, facilitando a identificação dos materiais que foram reprocessados ou não.

Além disso, existem indicadores químicos que avaliam parâmetros como vapor, temperatura e pressão, sendo empregados apenas em autoclaves. Outra ferramenta são os indicadores biológicos, testes contidos em ampolas plásticas com tampa permeável ao vapor, compostas por uma fita impregnada com uma população conhecida de endósporos, estes endósporos estão separados do meio nutriente (líquido roxo) por uma ampola de vidro. Os endósporos empregados pertencem à espécie Geobacillus stearothermophilus, sendo altamente resistentes ao calor úmido e não patogênicos. Eles são usados como um desafio, pois uma vez que são eliminados, todos os outros endósporos e formas vegetativas também serão. É importante ressaltar que os indicadores químicos e biológicos devem ser colocados em locais estratégicos, geralmente entre as embalagens e no centro da autoclave, para avaliar a eficácia da ação biocida do equipamento.

A classificação de Spaulding categoriza os artigos/produtos da seguinte forma:

Críticos: são aqueles que entram em contato com tecidos estéreis ou o sistema vascular, apresentando alto risco de contaminação.

Semicríticos: são aqueles que entram em contato com membranas, mucosas não lesadas e pele não intacta.

Não críticos: são aqueles que entram em contato com a pele íntegra.

Portanto, artigos como termômetros são considerados não críticos, enquanto bisturis são classificados como críticos. Quanto aos processos de limpeza, desinfecção e esterilização, essas categorias orientam as práticas apropriadas para cada tipo de artigo, conforme Tabela 2:

Classificação

Processo indicado

Artigo

Crítico

Esterilização

• Materiais cirúrgicos

• Agulhas, escalpes, cateteres, intravasculares

• Próteses/cateteres cardíacos

• Laparoscópios/artroscópios

• Materiais de implante

Semicrítico

Desinfecção de alto nível/desinfecção de nível médio ou esterilização (avaliando cada artigo) 

• Broncoscópios, colonoscópios, endoscópios

• Tubos endotraqueais

• Circuito de terapia respiratória

Não crítico

Desinfecção de baixo nível/limpeza (avaliando cada artigo)

• Estereoscópios/otoscópios/eletrocardiógrafos/muletas

• Utensílio de refeições

• Roupas

• Termômetros

Tabela 2 | Produtos para a saúde e processos de desinfecção e esterilização. Fonte: Adaptado de Hinrichsen; Ferreira (2013).

Procedimento Operacional Padrão (POP)

A prevenção da transmissão de infecções está intrinsecamente ligada às práticas adequadas de limpeza, desinfecção e esterilização de materiais, destacando a necessidade de conhecimento técnico e implementação de rotinas específicas. A esterilização, realizada pelo Centro de Materiais e Esterilização (CME), é crucial para eliminar microrganismos e esporos, sendo sua eficácia dependente da limpeza minuciosa do material. Cada fase do processo de esterilização deve seguir normas e parâmetros rigorosos, descritos em um Procedimento Operacional Padrão (POP) elaborado individualmente em cada instituição pelo responsável do CME, com apoio da equipe de controle de infecções, assegurando a eficácia do procedimento.

Para ver o exemplo de um POP, sugerimos que acesse o PDF Central de material e manutenção.

Desinfecção e esterilização

Para saber mais sobre os processos de desinfecção e esterilização, bem como a classificação de artigos segundo o risco biológico, sugerimos a seguinte leitura:

Esterilização e Desinfecção de Instrumental Cirúrgico e Outros Produtos para a Saúde. Disponível em: Minha Biblioteca.

Instrumentos cirúrgicos

Você já parou para pensar na complexidade de uma cirurgia? Além disso, refletiu sobre a necessidade de os instrumentos cirúrgicos serem estéreis? Relacionado a esta temática, o artigo intitulado “Centro de materiais e esterilização: rastreamento da limpeza automatizada nas cânulas de lipoaspiração” examinou a eficácia da limpeza automatizada de cânulas de aspiração de 4 mm utilizando uma lavadora ultrassônica. Isso foi feito por meio da avaliação da sujidade interna utilizando um dispositivo de microscopia específico para cânulas e pelo rastreamento de cepas viáveis de Staphylococcus aureus através de análise microbiológica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BRASIL. Resolução RDC nº 91, de 28 de novembro de 2008. Proíbe o uso isolado de produtos que contenham para formaldeído ou formaldeído, para desinfecção e esterilização, regulamenta o uso de produtos que contenham tais substâncias em equipamentos de esterilização e dá outras providências. Agência Nacional da Vigilância Sanitária. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 01 de dezembro de 2008.

BRASIL, Ministério da Saúde. RDC n° 15, de 15 de março de 2012. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2012/rdc0015_15_03_2012.html. Acesso em: 13 set. 2018.

HINRICHSEN, S. L.; FERREIRA, N. S. Esterilização e Desinfecção de Instrumental Cirúrgico e Outros Produtos para a Saúde. InBiossegurança e controle de infecções: Risco sanitário hospitalar. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

PREFEITURA MUNICIPAL DE BAURU SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE Protocolo: Central de Material e Esterilização (CME). 2023. Disponível em: https://www2.bauru.sp.gov.br/arquivos/arquivos_site/sec_saude/protocolos_saude/Central_de_Material_e_Esteriliza%C3%A7%C3%A3o/Procedimentos_Operacionais_Padr%C3%A3o_-_POPs.pdf . Acesso em: 4 nov. 2023.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PELOTAS. Sala de preparo e esterilização de produtos para a saúde e Métodos de monitoramento da esterilização. 2021. Disponível em: https://sai4.pelotas.com.br/arquivos/1f8c7d13f817f6ad23839dfa572d73e7.pdf. Acesso em: 17 jan. 2024.

SANTOS, R. K. et alCentro de materiais e esterilização: rastreamento da limpeza automatizada nas cânulas de lipoaspiração, Rev. Gaúcha Enferm. 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2022.20210057.pt. Acesso em: 17 jan. 2024.

SECRETARIA DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL. Manual de processamento de produtos para saúde. Brasília, 2020. Disponível em: https://www.saude.df.gov.br/documents/37101/0/Manual+de+Processamento+de+Produtos+para+Sa%C3%BAde+%281%29.pdf/99a89408-bfb1-4fc1-1097-5609026217b0?t=1674742092872. Acesso em: 6 nov. 2023.

SPAULDING, E.H. Chemical disinfection of medical and surgical materials. In: LAWRENCE, C, BLOCK, S. S. Desinfection, Sterization, and PreservationPhiladelphia: Lea & Febiger; 1968. p. 517-31.

TOMEDI, D. J. G.; ALBANESE, S. P. R. Biossegurança em centros de beleza. Londrina: Editora e Distribuidora, 2018.


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